sábado, 15 de abril de 2017

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Depois da crise

As crises demonstram o esgotamento dos estilos de governo e de seus projetos de desenvolvimento que enfrentam a resistência de grupos beneficiados pelo velho modelo, sem aceitar as reformas necessárias. A reação dos latifundiários contra a reforma agrária levou à explosão urbana e manteve a pobreza no campo. Nossa crise atual é o resultado do esgotamento dos recursos fiscais, usados sem restrições para atender às reivindicações de cada grupo social no curto prazo; e sem respeito às regras da boa gestão, nem aos interesses da Nação no longo prazo, sem adaptar a economia ao avanço das técnicas produtivas.

Como era previsível, acabou a possibilidade de considerar os recursos públicos ilimitados e o costume de evitar que os anseios e reivindicações de cada grupo social organizado fosse atendido. O esgotamento de recursos públicos e do protecionismo ao velho modelo levam à crise e seus sofrimentos, mas oferecem otimismo para o que poderá ocorrer de positivo quando a crise passar.

Essa pedagogia da catástrofe vai ensinar a valorizar a eficiência, a cultuar a redução de gastos, a preferir o bem-estar no lugar do consumo, a prestigiar o governante eficiente que faz mais gastando menos. A crise forçará a aceitação do limite nos gastos do setor público, quebrando a histórica ilusão fiscal de que o Estado teria dinheiro para tudo. A reforma que impõe o teto para gastos vai provocar a consciência republicana ao substituir reivindicações irresponsáveis por disputas responsáveis na elaboração dos orçamentos públicos. A política vai melhorar, quando os defensores do aumento de gasto em um setor lutar para reduzir gastos em outros setores.

A Lava-Jato trouxe perdas econômicas e políticas ao abalar a credibilidade de grandes empresários e políticos, mas pode provocar o aprendizado de que a indecência tem custo. É possível esperar que as empresas pós-crise serão mais eficientes, o eleitor será mais cuidadoso e os candidatos mais éticos.

Desperdícios de recursos, baixa taxa de natalidade e crescente aumento na expectativa de vida exigem reforma da Previdência. Muitos se opõem a ela, mas depois de realizada terá sustentabilidade e acabará com tratamentos desiguais.

Em nome de proteger direitos aos trabalhadores empregados, o conservadorismo impediu que o Brasil se adaptasse ao avanço tecnológico, condenando o país a baixas produtividade e competitividade. Se bem feitas, as reformas trabalhistas vão permitir que a economia seja mais eficiente e sintonizada com as exigências do avanço tecnológico.

Mas, se ficarmos prisioneiros do passado, defendendo privilégios daqueles que já participam do setor moderno em esgotamento, e o Brasil permanecer na crise por longos anos, continuando a disputa política, sem compromissos com a verdade, sem espírito público, nem visão de longo prazo, saltaremos da crise para a decadência, e desta a uma desagregação social da qual já sentimos
sintomas.

Temer fala de futuro com gente de passado sujo

.Ao escancarar a evidência de que a política tem código de barras e estava na prateleira para ser comprada por organizações como a Odebrecht, a Lava Jato aguçou o instinto de sobrevivência dos políticos brasileiros. Para entender os próximos lances da crise, você deve prestar atenção em dois movimentos. O governo Temer dirá aos parlamentares que o país não tem futuro se o Congresso não aprovar as reformas trabalhista e previdenciária. E os congressistas, fingindo que não têm passado, tentarão apressar uma pauta que lhes permita surfar no mar de lama: anistia do caixa dois, fundo público de financiamento eleitoral e voto com lista fechada, para esconder candidatos sujos do eleitorado.

Os dois lados têm pressa. Depois que as delações da Odebrecht ganharam o noticiário os relógios de Brasília já não têm ponteiros, mas espadas. Há mais mortos do que vivos no comando das articulações. E essa atmosfera fúnebre começa a produzir maquinações sombrias. Um grupo de deputados ameaça levar as reformas do Planalto em banho-maria se o governo não demonstrar empenho pela aprovação do kit de salvação dos mandatos ameaçados.

O governo fará na terça-feira um teste de prestígio. Temer convidou para um café da manhã no Palácio da Alvorada todos os deputados do condomínio governista. Na ponta do lápis, são 411 dos 513 deputados. Se comparecerem 300, o presidente soltará fogos. O número mínimo para aprovar uma emenda constitucional é de 308 votos. O governo talvez devesse evitar a divulgação de imagens do café da manhã. Haverá na mesa uma profusão de autoridades e parlamentares sob investigação. A exposição da cena pode passar a ideia de um abraço de afogados.

É Sábado de Aleluia

Eles não se emendam

Os partidos políticos estão se mobilizando para sensibilizar a Justiça Eleitoral a aceitar o dinheiro do Fundo Partidário como meio para quitar as multas que lhes foram impostas por mau uso desse mesmo fundo.

Não contentes em malversar os recursos públicos a eles destinados pelo Fundo Partidário, esses partidos agora pretendem driblar sua responsabilidade atribuindo ao contribuinte a obrigação de lhes financiar a multa devida por seu péssimo comportamento.

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O argumento para tão espantosa demanda é que os partidos, em resumo, estão sem dinheiro. Desde que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o financiamento eleitoral não poderia mais ser feito por empresas, mas apenas por pessoas físicas, as agremiações partidárias vêm encontrando dificuldades para fechar suas contas. O dinheiro fácil das grandes companhias, que fez a alegria daqueles que transformaram a política em negócio, estava destruindo a essência da democracia – afinal, o cidadão nada podia, com seu voto, diante do imenso poder de persuasão das grandes empresas, especialmente das empreiteiras. Foi contra isso que agiu o Supremo, para impedir que os partidos se transformassem de vez em meras subsidiárias dessas empresas.

Perdidos diante dessa nova realidade, os partidos, em lugar de pensar em estratégias para convencer seus eleitores a financiá-los, continuam a torcer para que o erário lhes venha em socorro. Dizendo esperar que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, tenha “sensibilidade para entender o momento”, o deputado Alex Manente (SP), da direção nacional do PPS, explicou que, em razão da crise econômica, “temos muita dificuldade para que filiados façam doações, mesmo que pequenas”. O presidente do DEM, senador José Agripino (RN), por sua vez, disse que “estabeleceu-se um impasse” e que, “se as multas forem pesadas, elas serão impagáveis”.

Para o deputado Lúcio Vieira Lima (BA), da Executiva Nacional do PMDB, a decisão do Supremo a respeito das doações para os partidos obriga a Justiça Eleitoral a mudar também as regras para o pagamento das multas. “Não foram os partidos que mudaram a regra, mas o STF. Logo, a regra para multas precisa mudar também. Se não temos recursos próprios, vamos pagar como? Não somos empresa, não temos receita própria”, disse Vieira Lima. Ora, esse dilema não existiria se, em primeiro lugar, os partidos não tivessem usado o dinheiro do Fundo Partidário para pagar jatinhos e caipirinhas, razão pela qual foram multados.

Para Vieira Lima, o Fundo Partidário “é a receita da democracia”. Com esse raciocínio, os deputados querem fazer acreditar que a democracia, em si, depende do Fundo Partidário, o que é um absurdo. O Fundo Partidário é essencialmente antidemocrático, pois obriga os contribuintes a colaborar para a manutenção de partidos com os quais não têm nenhuma afinidade. Esse fundo só existe porque os partidos são hoje incapazes de se apresentar como representantes do eleitor comum, do qual deveriam vir, por livre vontade, os recursos que lhes assegurassem a existência. Assim, em vez de lutarem para se tornar partidos políticos de verdade, as atuais agremiações empenham-se em encontrar maneiras cada vez mais criativas de manter sua relação de dependência com o dinheiro público.

É nesse contexto que surgiu também a ideia de um “Fundo Especial de Financiamento da Democracia”, incluída na proposta de reforma política relatada pelo deputado Vicente Cândido (PT-SP). “A democracia tem seu custo”, argumentou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Não há dúvida que a atividade partidária, especialmente as campanhas eleitorais, tem um custo, mas esse custo havia atingido um nível tal que não podia mais ser bancado senão com o dinheiro de empresas. Agora sem esses recursos, os partidos podem optar por fazer campanhas mais baratas e mais próximas dos eleitores, sem a caríssima infraestrutura marqueteira que foi paga com dinheiro sujo por diversos partidos. O que não podem é continuar a acreditar que, façam o que fizerem, serão sempre credores compulsórios dos cofres públicos.

Entre a pinguela e a Constituinte

Os efeitos políticos das delações dos executivos da Odebrecht não são ainda mensuráveis. Não há dúvida de que são avassaladores, mas até que ponto podem inviabilizar a pinguela do governo Temer?

O público busca assimilar o conjunto das denúncias, que, por sua extensão e abrangência, exigirá mais tempo para articular os fatos e estabelecer uma hierarquia entre os infratores.

Mas o que já revelam – e se trata apenas de uma entre muitas empreiteiras – estabelece uma pá de cal naquilo que ficou conhecido como Nova República, que, por sua vez, representou a restauração do poder civil, depois de duas décadas de regime militar.

Após 32 anos – e 13 de PT -, políticos e política estão no banco dos réus. Não se conhece momento semelhante na história do país, desde o grito do Ipiranga, em 1822.


Lula emerge como o grande vilão, mas não está só. Seus adversários históricos – os tucanos, sobretudo – lá estão. Não sobra ninguém, a não ser um ou outro isoladamente.

Mas as instituições estão no chão, os políticos, em graus variados, sem crédito para seja lá o que for. A própria mídia está incluída. O diferencial dessa crise – e que a torna imprevisível – é o advento das redes sociais, que articula a população, à revelia dos canais clássicos – governos, sindicatos, associações, ONGs.

Nenhum desses segmentos, que promoveram mobilizações históricas anteriores, como as diretas já e o impeachment de Collor, influiu sobre as manifestações que tiraram Dilma Roussef do poder. E são, de longe, as maiores de toda a história.

Enquanto a crise tinha o selo de um partido, o PT, parecia mais fácil administrá-la. Era tirá-lo do poder e promover sua substituição até as eleições do ano que vem. As investigações, porém, mostraram um cenário mais complexo, marcado por ampla cumplicidade. Nenhuma legenda escapou.

O governo Temer mostrou-se parte do problema e mesmo a oposição anterior, que atraiu para sua base de apoio, exibe a marca do contágio moral. Abre-se amplo espaço para incursões aventureiras, embora a população exiba um grau sem precedentes de monitoração dos acontecimentos, em condições de imunizar-se.

No curto e no médio prazos (no longo, todos estaremos mortos), há mais perguntas que respostas. No curto: terá o governo Temer condições de empreender as reformas, que, por serem essenciais, são problemáticas, como a previdenciária, a trabalhista, a política? Ninguém tem uma resposta, embora ninguém negue a necessidade imperiosa de fazê-las.

No médio prazo, pergunta-se: o que será dos atuais partidos, os principais, que infringiram a lei que os regula e que pode levá-los à perda do registro? Se depender da população – e por enquanto não depende -, já vão tarde. Mas aí o que será do país?

Não há democracia sem políticos e sem partidos. E a substituição de uma geração que reina há três décadas não se improvisa. O fato de a principal liderança emergente – o prefeito de São Paulo, João Dória – ser um outsider, há apenas quatro meses na cena pública, evidencia a escassez de quadros e perspectivas.

Em tal contexto, começa a prosperar a ideia de uma Assembleia Nacional Constituinte, defendida por juristas respeitáveis, como Modesto Carvalhosa e o ex-presidente nacional da OAB, Reginaldo de Castro. O pacto social da Nova República esgotou-se.

Defendem, no entanto, uma Constituinte diferente de todas as que a precederam na história republicana: exclusiva, sem partidos e que se autodissolveria com a promulgação da Carta.

Se se repetir o padrão das anteriores, de Congresso Constituinte, as distorções da atual Carta, que, em 29 anos de vigência, já tem 95 emendas e mais de mil outras em tramitação, serão apenas renovadas. É o que sustenta Reginaldo:

“O presente modelo, oligarca, corporativista, cartorial, recheado de privilégios de castas, abrigados sob o guarda-chuva estatal, não será removido de modo algum se a nova ordem constitucional derivar mais uma vez de um Congresso-Constituinte.”

A discussão está aberta. Por enquanto, é a única ideia para enfrentar os efeitos da devastação moral que se abateu sobre a República. A alternativa é continuar investindo na pinguela.

Quem vai para a rua contra o acordão

P. O senhor recebeu pressão no partido para continuar a obra?
R. Não, mas todo mundo ficou... Sou tratado como um cara exótico.
O trecho acima é de uma entrevista do ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), ao jornal O Estado de S. Paulo na quinta-feira. Haddad comenta com o repórter o pedido de investigação de sua campanha de 2012, acusada de receber caixa 2 da Odebrecht a pedido de Lula, segundo delatores da empresa. Nas entrelinhas, Haddad disse que, se aconteceu, foi via diretório nacional do PT, ao qual ele não tem controle.

Muito cômoda a entrevista inteira. Repete que, como todos estamos vendo sem parar há dias, a Odebrecht se achava dona da prefeitura e do Brasil. Dá a entender que gente no PT gostaria de ver nele uma prática mais amistosa com a empresa, que “é tratado com um cara exótico”. É só isso que um jovem e promissor líder da esquerda tem a dizer? Ser, no máximo, exótico dentro de uma estrutura que, desde que ele não suje as mãos, pode ser até que receba caixa 2?

Antes que comece o festival de relativismo, o argumento aqui não é defender que apenas alguns, seletivamente, ajoelhem no milho. Para ficar apenas entre eminentes políticos com berço na USP, Fernando Henrique Cardoso, o ex-presidente tucano, há semanas lançou que caixa 2 não é um crime como os outros, como quem diz que é preciso separar o joio do joio enquanto seus companheiros de partido, Geraldo Alckmin, José Serra e Aécio Neves protagonizam novas denúncias. Depois que Emilio Odebrecht falou assim, por alto, que houve caixa 2 para sua campanha presidencial, FHC gravou um vídeo pedindo colocar "as cartas na mesa", enquanto a Folha de S. Paulo noticia tratativas, das quais ele faria parte, para um acordão que incluiria anistia do caixa 2 e manter a elegibilidade de Lula.

Pois bem, as cartas estão na mesa e o jogo é desesperador. É tanto cinismo junto que dá uma espécie de vertigem. "Se não for o acordão, serão os aventureiros", é o que gritam os defensores do acerto, em espécie de chantagem. E então desce pesada uma nuvem de desânimo para quem não quer se redimir a esse binarismo barato, mas acredita na clássica máxima política de que não há vácuo de poder.

Nunca antes na história desse país vimos a enxurrada de aulas de corrupção, de business as usual, de didatismo sobre o mecanismo de pressão de grandes doadores na política. A Odebrecht, diga-se, cai em desgraça quando já havia perdido o posto de maior doadora universal - na campanha de 2014, a vencedora foi a “campeã nacional” da carne JBS. Vamos esperar o próximo escândalo? Porque há exemplos de sobra. A Odebrecht, que agora reencarnada como moralizadora-delatora se arvora até mesmo a dar lição de moral na imprensa por se chocar com a corrupção, foi ela mesma protagonista e sobrevivente de vários escândalos, um dos mais célebres o dos Anões do Orçamento em 1992. É especialmente chocante ver que, enquanto o processo do mensalão se desenrolava, o PT e grande parte do sistema político faziam os acertos de sempre para receber contribuições de campanha via caixa 2 e venda de legislação, segundo os delatores. Então, é a Justiça, até agora, para surpresa de muitos, o único Poder livre dos tentáculos da Odebrecht no relato dos delatores, que vai nos salvar? O temor da cadeia, que nem pode vir com os tempos do STF, que vai melhorar as práticas? Não parece verossímil.

Não se quer jogar na lata do lixo a história e os serviços prestados ao país do PT e do PSDB, mas quem neles será capaz de liderar uma ruptura inequívoca com o show de horrores a que estamos assistindo? Fora deles, quem vai para a rua agora exigir regras de transparência que sejam válidas para a eleição de 2018? Não se ouve nada.

Em oração ao Santo Demo

Que ninguém busca consciência,
e todo mundo dinheiro

Gil Vicente, "Todo Mundo e Ninguém"

Paisagem brasileira

Chapada Diamantina - Brazil:
Chapada Diamantina (Bahia)

Crise anunciada

Dizem os historiadores que Roma não caiu "da noite para o dia". Antes, foi vítima de um longo processo de corrosão de suas fundações. Foram atitudes pequenas, erros de menor monta e pecados nem tão graves assim que, ao longo dos anos, destruíram conceitos sagrados como a moralidade, o amor pela coisa pública, a cidadania e outros de idêntico jaez, sem os quais não há Estado que sobreviva.


No mais das vezes, uma civilização que vive um processo desses sequer se dá conta de sua existência. Afinal, poucos se dão ao trabalho de analisar o conjunto de uma realidade, diante da rotina de pequenos eventos isolados que esta mesma realidade nos impõe.

Sempre penso nesta reflexão quando me deparo com o denominado "mundo das leis". Fico a me perguntar se não estaríamos trilhando, sem que o percebamos, um caminho de lenta, porém permanente, corrosão dos pilares que sustentam nossas instituições.

Os sinais estão visíveis, aqui e ali. Isoladamente, pouco dizem. Mas que tal uni-los todos?

Inicio com o clássico "ma Code est perdue", desabafo de Napoleão Bonaparte ao ser informado de que a legislação que concebera estava sendo interpretada pelo mundo jurídico.

Avanço alguns séculos no tempo e chego ao musical "Chicago", que percorreu todo o planeta, e no qual juízes e advogados são tratados como inúteis pomposos, corruptos e gananciosos.

Citaria o filme "O Juiz", mostrando um modelo de justiça que, não sem profunda ironia dos seus autores, extingue juízes e advogados como os conhecemos. Ou o filme "Cobra", não menos famoso, que lança diretamente sobre os ombros de juízes e advogados toda a culpa pelos índices de criminalidade que nos atormentam.

Que tal somarmos as já incontáveis piadas sobre juízes e advogados, contadas pelas ruas e em programas de rádio ou televisão?

Arrisco dizer, à vista de todos estes elementos, que estamos em meio a um considerável processo de enfraquecimento de nossas instituições - a quem duvidar disso, sugiro ir às ruas e perguntar àquela senhora chamada "opinião pública".

Fico, contemplando esta quadra histórica, a recordar o famoso conselho de Benjamim Disraeli à rainha da Inglaterra: "Majestade, o povo está insatisfeito. Clama por mudanças. Se estas mudanças não forem feitas por nós, serão feitas sem nós, e, o que é pior, contra nós".

Pedro Valls Feu Rosa

Beco sem saída

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O projeto de reforma política em discussão na Câmara pode levar as eleições de 2018 a uma enrascada.

O texto prevê a criação de um Fundo de Financiamento da Democracia, com recursos do Orçamento da União, no valor de R$ 2,1 bilhões. É três vezes maior que a dotação do Fundo Partidário para este ano.

Os recursos terão de bancar 35 partidos, mas 98% do total irão para as 25 legendas que elegeram representantes em 2014.

Um terço do valor foi reservado às campanhas majoritárias. E o restante, cerca de R$ 1,4 bilhão, às campanhas de deputados federais e estaduais.

Na eleição passada, houve 24 mil candidatos a essas vagas. Se a regra estivesse em vigor, cada um teria R$ 58, 3 mil para custear sua eleição.

Uma revisão nas regras que proíbem doações eleitorais de empresas já é defendida, inclusive.

Por um país sério, eficiente e moderno

“O Brasil não é um país sério”. Esse veredito de Carlos Alves de Souza Filho é atribuído a Charles de Gaulle, porque os brasileiros invocam figuras mais ilustres para conferir peso maior às suas considerações. Foi uma injustiça ao presidente da França, que não faria avaliação desabonadora sobre outra nação, conforme reza a etiqueta internacional.

Tal afirmativa tem, entretanto, pontuado análises de deploráveis momentos de nossa história pelo seu cunho de verdade; vou, então, usá-la aqui, porque os escândalos de corrupção vicejam em todas as esferas do Estado. A lista apresentada pelo ministro Luiz Edson Fachin, no dia 11 de abril, mostrou, por exemplo, como as principais autoridades recorrem a expedientes ilícitos para conquistar postos-chave na administração pública e desviar preciosos recursos da comunidade em proveito próprio. O Brasil não é, portanto, um país sério, porque permite que tantas figuras proeminentes construam uma grande rede de saqueadores da pátria, sem que medidas efetivas sejam tomadas para coibir essas práticas e recuperar a riqueza nacional.



Sabíamos que a corrupção grassava em diferentes esferas do Estado, mas não imaginávamos que fosse tão extensa. Este país não é mesmo sério, porque essas autoridades não se penitenciam pelos seus crimes e vêm com argumentos irritantes para escapar das denúncias. Fazem, em seguida, ameaças públicas a promotores e juízes, como se fossem eles os criminosos, embora estes estejam agindo no estrito cumprimento de seus deveres funcionais para desbaratar quadrilhas espalhadas por toda parte. Como um Estado pode sobreviver à tamanha distorção de avaliação entre quem respeita a lei e quem é transgressor? Como os cidadãos comuns vão acatar o ordenamento jurídico de seu país para que haja preservação da integridade nacional?

O Brasil não é um país sério porque está permitindo que os parlamentares criem filigranas na legislação para se blindarem e permanecerem nos cargos, apesar de seus extensos prontuários na Justiça. Além disso, o presidente vai manter investigados no primeiro escalão, o que lhes garante ótimas oportunidades para bloquear os agentes policiais, intimidar testemunhas e destruir provas. Contando com a tutela do Palácio do Planalto, será, então, difícil apurar todos os fatos e definir as penalidades para esses poderosos. Além disso, podem surgir fissuras entre os Três Poderes, com riscos de ruptura institucional, em que os integrantes das teias do crime irão preservar a malversação da riqueza nacional e os desmandos no planejamento dos serviços públicos.

O Brasil não é um país sério porque custeia viagens ao exterior da ex-presidente da República para expor crises internas a partir de seu viés, ignorando o figurino de estadistas discretos e equilibrados. Ela fomenta, enquanto isso, o interesse dos países desenvolvidos pelas excentricidades dos nativos do Terceiro Mundo que continuam arredios aos preceitos da modernidade.